O DIAGNÓSTICO
A Escola – básica e secundária – é percebida, antes de mais, como uma instituição algo desarticulada, uma instituição pouco admirada. A Escola não se articula com o meio em que se insere e pouco tem em conta o futuro profissional dos seus alunos. No seu interior ela reúne dinâmicas pouco convergentes dos principais actores: alunos, professores e pais. No seu exterior, a agenda da comunidade vai correndo de modo independente ao que se passa e ao que se poderia esperar da Escola.
A Escola actual tende a colocar-se numa posição de neutralidade, de alguma indiferença perante as dinâmicas sociais, aparentando evidente dificuldade em encontrar o seu papel.
Gestores e Empresários sentem que há heterogeneidade de situações, que não haverá uma escola – tipo. No meio daquele panorama de fraca articulação entre Escola e Vida , haverá escolas de qualidade, experiências bem sucedidas de ensino e aprendizagem – mas não é fácil encontrar um padrão, uma lógica, por onde possa passar a explicação mais estrutural desses sucessos. E, sobretudo, constata-se o isolamento das escolas que têm melhores práticas, a incapacidade ou desinteresse em quererem aprender umas com as outras.
Escolas Públicas e Privadas
Esta dificuldade em encontrar um padrão de sucesso torna-se mais clara, quando se analisa o binómio Escola Pública- Escola Privada: é que as diferenças não se centram no essencial, antes em circunstâncias exteriores ao processo educativo. Assim, caracteriza-se o Ensino Público como fortemente permeável ao meio em que uma dada Escola se situa – a sua qualidade é reflexo do meio. Junta-se, ainda uma ideia de que pode haver mais ou menos “sorte” na alocação de recursos humanos.
Quanto ao Ensino Privado o seu principal traço distintivo residirá na dimensão de Segurança que oferece aos seus alunos. Encontram-se neste segmento, algumas Marcas de Prestígio – quase sempre identificáveis, em primeiro lugar a partir da qualidade das infra estruturas, de recursos e equipamentos. São poucas as referências positivas criadas a partir do valor percebido do projecto educativo da Escola – projectos geralmente atribuídos à própria história e tradição do estabelecimento.
Dos aspectos mais criticados do actual panorama da Escola ressalta a ausência de um Projecto Educativo próprio para cada escola. Empresários e Gestores observam que a interacção única que haverá em cada comunidade educativa, com alunos, professores e famílias concretas inseridos em meios sociais e económicos específicos, pouco está reflectida na prática e no horizonte de cada Escola. Não há, aparentemente, um trabalho de criação de uma Proposta de Valor que assegure bons níveis de Eficácia e de Responsabilização.
O Desempenho dos Professores
A figura do Professor é objecto de reflexão crítica neste Estudo. Estabelecendo inevitáveis comparações entre os Quadros que têm nas suas empresas e o Professor, como Quadro da Instituição Escola, Empresários e Gestores interrogam-se acerca da genuinidade da Vocação para muitos dos professores, o que trará consigo fortes limites á sua capacidade de motivação dos alunos. Observam uma queda acentuada do prestígio social da classe docente.
Admite-se que o Professor se tenha acomodado a uma Escola rotinada na gestão do dia a dia. Mas, sobretudo, salienta-se que a ausência de mecanismos (essenciais nas empresas) da Avaliação de Desempenho pode impedir o desenvolvimento profissional do Professor, contribuindo para um círculo vicioso de perda de relevância e de estatuto da classe.
A Fragilidade das Famílias
A situação torna-se mais pertinente se tivermos em conta uma outra dimensão presente no discurso de Empresários e Gestores: a fragilidade do Actor Família. Está muito presente a ideia de que a pressão que se exerce sobre as famílias urbanas opera fortes desvios educacionais, fáceis cedências a uma lógica de consumismo acrítico. A Família, ela própria fragmentada, não consegue ajudar a produzir discursos de síntese, não tem condições para articular – na sua prática quotidiana – a experiência trazida da escola.
Por outro lado, a circunstância de a Família ser uma estrutura natural onde se manifesta a vida profissional, onde há membros – os pais – que têm uma experiência diária do que é trabalhar, aplicar conhecimentos, é uma realidade aparentemente desperdiçada.
A necessidade de Disciplina
O diagnóstico pode ser completado com um tópico, que está de volta: a Disciplina. Reconhece-se a incomodidade do assunto, presente que ainda está a memória do autoritarismo de outros tempos. Mas também se reconhece a premência de introduzir uma no
va forma de comportamento individual e de grupo, assente na responsabilização das acções, no entendimento e acatamento de regras, na capacidade de pôr ordem em sistemas cada vez mais dinâmicos e imprevisíveis.
Para quem participou neste Estudo, a Escola actual apresenta um perigoso deficit nesta matéria. A fraca aposta na Disciplina, na Organização do Trabalho, aumenta significativamente a descaracterização da Escola, deixando-a presa fácil da “desordem social” vivida fora dos muros. De um modo mais vasto, a Escola ao não conseguir imprimir no seu interior um ambiente de Disciplina Inteligente, não está a equipar os alunos para enfrentar a Complexidade.
UMA NOVA PERSPECTIVA
Desenha-se uma Escola que seja um Espaço – Experiência focalizado na Educação completa de crianças e jovens, que se saiba situar no início de uma fileira que culminará na actividade social e economicamente produtiva, criadora de riqueza humana e proporcionadora do desenvolvimento da comunidade nacional.
Pelas entrevistas vão passando os traços de uma Escola Imaginada: uma instituição que consiga viver numa tensão contínua entre Viver, Fazer e Pensar o que acontece. Que seja capaz de Integrar o Conhecimento que vai sendo gerado, em vez de o deixar em camadas soltas. Pede-se treino efectivo para a Mobilidade, para o Imprevisto, gerando mais modelos de compreensão da realidade viva do que conteúdos de arquivo, estáticos.
Pede-se significativamente uma Escola que forme para a Iniciativa, para a Extroversão, desenvolvendo pessoas inteiras – intelectual, emocional, moral e fisicamente – que saibam criar um espaço próprio de expressão pessoal, motivados pela procura de soluções para uma situação e não pela reacção a uma cadeia automática de comando.
Empresários e Gestores convidam a Escola a desdramatizar o conceito de Empresa, de Mercado, abandonando preconceitos no que respeita á relação entre universo escolar e universo empresarial. Importará reconsiderar o Valor do Trabalho, começando aliás pela própria Escola e pelos seus profissionais.
Aponta-se, então, para uma Escola capaz de realizar uma dupla operação: apresentar um Ponto de Vista sobre o Mundo, elencar e defender Valores que decorram desse Olhar e, ao mesmo tempo, trabalhar para níveis de adequação às necessidades de Recursos Humanos concretos de uma dada comunidade, tendo em conta o seu plano estratégico de desenvolvimento.
O Papel Decisivo do Professor
Em todas as entrevistas realizadas é visível que a memória da Escola de infância e adolescência está ocupada por professores que marcaram os alunos de então e ajudaram a estruturar a personalidade dos actuais adultos.
É no Professor que se concentra a capacidade de transmitir Valores, de um modo imediatamente apreendido pelos alunos – mais do que conteúdos, são as atitudes que são registadas e que são incorporadas na vida dos jovens. De um bom Professor, os alunos esperam a capacidade de seleccionar o que é relevante, de enquadrar e explicar a diversidade das coisas que se sucedem e se vão aprendendo.
Respeitam-se mais os que deixam transparecer Convicção no que afirmam e que conseguem ser promotores persistentes do Trabalho em Equipa, dando-se a si próprios como exemplos de que só em conjunto, solidariamente, se podem atingir objectivos superiores.
Empresários e Gestores visualizam um Professor enquanto Quadro Qualificado de uma Organização, que tenha poder de decisão – conquistado por mérito – que se mova num ambiente de objectivos pré- definidos, participados por si e constantemente em avaliação de progressão e de resultados.
Um Aliado a conquistar
A revitalização da Escola, a realização de todo o seu potencial, requer a entrada em cena de um Actor pouco activo até ao momento: a Comunidade onde a Escola se insere.
Uma aproximação deste tipo afasta a ideia de uma Escola Implante num dado espaço físico e pode criar condições para que a Escola se transforme numa Plataforma de Relação entre grupos sociais habitualmente afastados entre si. Os entrevistados projectam situações de encontro entre decisores no plano político, económico e pedagógico e acreditam que a dinâmica daí resultante pode ajudar a mudar a Escola no terreno.
A abertura deliberada da escola ao meio constitui uma peça essencial para definir um Curriculum mais relevante, mais atraente. Assim, a par de um reforço teórico expresso em disciplinas como Português, Inglês, História, Matemática e Filosofia – esta na perspectiva de interrogação fundamental sobre o sentido da vida e que conduzirá, aliás, ao centro do Projecto Educativo de cada Escola – os Empresários e Gestores estabelecem um curriculum. Será bom, por exemplo, que se institua uma Cadeira Cívica com peso, que motive a níveis mais exigentes de responsabilidade social – uma cadeira a desenhar não de modo expositivo, mas com feições práticas, com exercícios no próprio espaço de Vizinhanças.
Mas, importante também, a abordagem à Tecnologia, a sensibilidade à Inovação, o gosto de ver as últimas descobertas no momento da sua aplicação, admitindo-se que o potencial de aprendizagem que vem do contacto físico com a realidade seja muito superior à linguagem dos livros ou dos laboratórios.
Um último nível onde a abertura ao meio se torna fundamental é o do Desporto, da expressão física das pessoas. Ao longo deste Estudo são muito frequentes as referências ao papel central que a actividade física, a expressão corporal, o nível de apresentação pessoal detém no processo de formação da personalidade. Este requisito poderá ser mais facilmente atingido se a Comunidade onde se insira a Escola tenha uma visão de gestão optimizada de recursos disponíveis.
QUAL PODE SER O CONTRIBUTO DAS EMPRESAS?
Empresários e Gestores assumem-se como partes interessadas na discussão e formulação do Sistema Educativo Português. Entendem que podem contribuir, a partir da sua experiência e visão do Mundo, no sentido de criar um progressivo ajustamento entre Escola e Sociedade.
No plano conceptual, acredita-se que há contributos a dar para uma nova linguagem, que passe a incluir aspectos como definição de objectivos e luta por os atingir, competências de trabalho em equipa, orientação em cenários complexos e imprevistos, naturalidade dos processos de avaliação de desempenho, indispensabilidade da qualidade em ambientes competitivos, sentido de gestão de recursos.
Num plano mais prático, trata-se de reavaliar os produtos e os serviços de consumo, de os desconstruir – revelando o trabalho e o saber que está por detrás de cada um, como ali estão aplicações de aprendizagens recebidas na escola. Será boa ideia reformular o modelo das tradicionais Visitas de Estudo (às empresas), ampliando-as e produzindo reciprocidade com Visitas de Empresa (às escolas). Poderá ser introduzida a ideia de estágios antecipados, para estudantes pré universitários, facilitando a ambientação a uma próxima inserção profissional.
Os Empresários e Gestores entrevistados consideram fundamental aumentar a Qualidade do Emprego que estão a oferecer aos seus Colaboradores. Este sentido de responsabilidade deverá ser apurado, de modo a permitir às Famílias uma maior elasticidade de tempo para dedicar ao acompanhamento dos seus filhos.
O Estudo revela que há da parte dos Empresários e Gestores uma disponibilidade e gosto em criar mecanismos de aproximação aos Professores. A criação de estruturas flexíveis que juntassem estas classes e que levassem a uma melhor compreensão mútua poderia ser um bom contributo deste Trabalho de Pesquisa Qualitativa