Porque saí da Nike!

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Ex-diretora da Nike Portugal explicou por que renunciou ao cargo para criar fundação em Moçambique
Por Samuel Mendonça

Alexandra Machado, que ao fim de 10 anos renunciou às funções de diretora-geral da Nike Portugal e de responsável ibérica da empresa desportiva para fundar uma ONG de apoio a raparigas adolescentes em Moçambique, disse aos empresários algarvios que foi “totalmente levada ao colo por Deus para esta missão” que iniciou há dois anos.

“Por saber que Deus me deu talentos e que eu tenho de os pôr ao serviço daqueles que mais precisam, tomei esta decisão”, justificou ontem à noite no jantar-palestra promovido pelo núcleo do Algarve da ACEGE – Associação Cristã de Empresários e Gestores no Colégio de Nossa Senhora do Alto, em Faro.

Aquela gestora, que abordou o tema “O Sucesso Profissional e o Amor”, exortou cada uma das 33 pessoas presentes a descobrir qual o seu papel na “luta contra a pobreza e contra a economia de exclusão” e apontou o principal desafio: “escutar mais e estar muito mais atento àquilo que os outros precisam, a deixarmos de estar focados em nós próprios para estarmos focados em quem connosco trabalha”.

A oradora considerou mesmo este como um dos principais critérios do “princípio do amor ao próximo” desenvolvido pela ACEGE que disse ser “fundamental” na sua atuação. “Acredito que é um princípio extremamente eficaz e a melhor forma de gerir uma empresa pelas relações de confiança e lealdade que cria no grupo com quem trabalhamos. Quando, no nosso trabalho, colocamos o princípio do amor ao próximo, o desafio torna-se pessoal, fazemos crescer e crescemos nós; passamos da perspetiva de «o que eu quero» para a de «a que é que eu sou chamado»”, justificou, explicando que o foco nas necessidades do outro aplica-se tanto ao acionista como ao trabalhador, ao cliente ou ao fornecedor.

Alexandra Machado, que classificou a sua palestra como um “testemunho de um discípulo” que anda a tentar perceber o que é Deus lhe pede, garantiu ter sido a sua “caminhada pessoal” que a levou um dia a tomar a decisão de “rutura e de mudança de caminho”. “Nem sempre tive esta ligação entre a minha vida profissional e a minha vida de fé tão nítida como hoje a tenho. Para melhor servir e amar, cada um de nós tem que passar por um discernimento para perceber qual a melhor forma de potenciar os talentos que Deus nos deu. Tenho tido o privilégio de fazer uma caminhada de fé em comunidade (na ACEGE também) que me tem ajudado no meu discernimento e no meu crescimento”, sustentou.

Neste sentido, a oradora lembrou que a determinada altura houve uma pergunta que lhe começou a inquietar a mente: “se hoje terminasse a minha vida, o que é que Deus quereria que eu tivesse feito?”. “Nesta caminhada de conversão pessoal, de conversa com Deus, quando lhe damos espaço, Ele vai-nos dando algumas dicas”, acrescentou.

A mentora da Girl Move, que já também trabalhou no grupo Entreposto e no grupo Jerónimo Martins, explicou que a fundação em Moçambique tem como objetivo o apoio a raparigas em países em subdesenvolvimento como “fator fundamental” para quebrar um “ciclo de pobreza”. O projeto-piloto em curso em Nampula, no norte do país, passa então pela formação de líderes comunitárias.

“Tem sido das experiências mais ricas que alguma vez tive em 24 anos de vida profissional, talvez pela exigência, pelo desconforto, pela perplexidade do que existe e pelas situações de sofrimento provocado pela pobreza e pela ameaça constante à dignidade humana que tenho visto, mas também, e sobretudo, pelo sorriso que se vê sempre estampado naqueles que mais sofrem e por uma «luz» que ilumina a quem mais precisa. Tudo isto tem sido transformador para mim e a força que tenho recebido de tantas mulheres que lutam todos os dias, da forma que podem e sabem, é um sinal sempre presente de Deus que me guia”, testemunhou Alexandra Machado.

A gestora disse ainda que aquele projeto “de equipa”, desenvolvido em parceria com a Nike Foundation, só tem sido possível enquanto “vivência de família” porque apoiado pelo seu marido, pelos seus três filhos e por um empresário português que não quis divulgar.

Ressalvando não ser preciso ir para Moçambique para “seguir Cristo” porque isso pode ser feito, desde logo, na casa de cada um, Alexandra Machado frisou que cada ser humano é “chamado” a “estar aberto” àquilo que Deus o chama a fazer e a ter uma “coragem” que confessou durante anos não ter tido.

O jantar-palestra de ontem foi precedido pela celebração da eucaristia presidida pelo bispo do Algarve, D. Manuel Quintas, na capela do Colégio de Nossa Senhora do Alto, na qual estimulou os empresários cristãos a prosseguirem na difusão dos valores do evangelho.