Pela primeira vez, as empresas têm de gerir três gerações com diferentes lógicas de trabalho e preocupações. Diogo Alarcão avisa que devem ser flexíveis na organização e nas compensações para evitarem as tensões internas
POR ANTÓNIO LARGUESA
© Jornal de Negócios
O “age management” (a gestão da idade) é referido por Diogo Alarcão como um tema estratégico para as empresas, que precisam de adaptar não só a sua comunicação interna, como os benefícios que disponibilizam aos trabalhadores das três gerações que, de forma inédita, coexistem no mesmo local de trabalho. Em Portugal o desafio é ainda maior porque “começa já a haver” défice de talento jovem e “não haverá gente nova para fazer o rejuvenescimento das empresas”.
Que impacto tem o envelhecimento activo para as empresas?
Um primeiro desafio é como adaptar os modelos de negócio e a forma de trabalhar para pessoas que vão estar no activo mais tempo. Na indústria, à medida que vão envelhecendo, vão perdendo capacidades físicas e as empresas têm de alterar a organização do tempo de trabalho ou questões ergonómicas relativas à produção em linha. Nos serviços, a questão é como valorizar essas pessoas mais seniores e requalificá-las para temas ligados à formação e para a partilha de informação de forma mais estruturada, também porque algumas delas têm maiores dificuldades de adaptação tecnológica. Em vez de negociar uma pré-reforma ou um despedimento, procurar que partilhem o seu capital intelectual e a sua experiência com as gerações mais novas.
A atracção, gestão e retenção de talento está ainda focada nas gerações mais novas e isso vai trazer problemas às empresas dentro de uma década, antecipa Diogo Alarcão, que propõe soluções para o aproveitamento destes profissionais com experiências
Qual é o segundo desafio?
Estamos a assistir – e isto é novo, nunca existiu no passado – à convivência de três gerações nas empresas, que têm lógicas de trabalhar e preocupações distintas. A “baby boomer”, nascida até ao início dos anos 1960 e muitos ainda estão no activo; a “geração X” (anos 1960 e 1970); e a “geração Y”, nascida nos anos 1980 e 1990. É crítico que as empresas estruturem não só a sua comunicação interna, como a compensação e os benefícios que são disponibilizados a estas populações que são muito diferentes, indo ao encontro das suas necessidades e expectativas.
Com benefícios flexíveis?
Exactamente. A empresa tem de perceber qual é a sua força de trabalho e o que as motiva. Para quem está na casa dos 50 ou 60 anos, mais perto da reforma, as preocupações serão mais ligadas à saúde, com as pensões, com a poupança para a reforma. Entre os 35 e 50 anos serão relacionadas com a educação dos filhos, a própria formação pessoal e os cuidados de saúde com ascendentes. A população entre os 25 e 35 anos valoriza muito a formação e o equilíbrio entre a vida profissional e familiar, nalguns casos com as primeiras necessidades na família, o primeiro filho que nasce. No fundo, o ciclo de vida vai mudando e as preocupações são distintas ao longo da vida.
Além dos benefícios, quais são as práticas de Recursos Humanos que mais valorizam?
Os valores e os “drivers” motivacionais são distintos de geração para geração. A geração mais sénior ainda aprecia e valoriza muito uma organização planeada do trabalho, a previsibilidade e uma cadeia hierárquica de decisão. Estão habituados a relações mais formais em termos de comunicação e de reporte. Na geração mais nova é precisamente o contrário. Portanto, as empresas devem respeitar este tipo de “drivers”.
E essa diferenciação evita também as tensões internas?
As empresas que têm essa flexibilidade em princípio evitam este tipo de tensões e as pessoas acabam por se sentir mais felizes, produzem resultados melhores e clientes mais satisfeitos. E a remuneração e as compensações acabam por ter um papel importante nessa diminuição das tensões. Outra coisa que se verifica é a maior capacidade de trabalho e empatia entre as gerações que estão nos extremos – a “baby boomer” e a “geração Y” – do que entre a “geração X” e a “geração Y”. Ou seja, equipas que têm pessoas mais velhas e mais novas a trabalhar em conjunto, por vezes funcionam melhor do que quando estão mais próximas em termos de idade, embora em gerações diferentes.
O que está a acontecer em Portugal?
Portugal tem desafios ainda maiores porque não haverá gente nova para alimentar e fazer o rejuvenescimento das empresas. Começa já a haver um défice de talento nas gerações novas. Isto é, empresas que não conseguem recrutar talentos ao nível que pretendem, nomeadamente em sectores específicos, como as tecnologias, algumas engenharias e algumas áreas da saúde. Apesar do desemprego jovem, há uma dificuldade em atrair algum talento novo e a tendência é para piorar.
E no outro extremo da pirâmide?
Vamos ter uma população activa ainda mais envelhecida do que nos restantes países europeus. Se não houver capacidade de motivar e de pedir uma adaptação a esta geração mais velha, as empresas podem ficar com um problema nas mãos, que é não conseguir planear a sua força de trabalho.
As empresas estão esquecidas do talento sénior, que continuará dentro da estrutura?
A atracção, gestão e retenção de talento está ainda focada nas gerações mais novas. A gestão de talento sénior não está na agenda das empresas. E uma empresa com uma idade média de 45 anos tem necessariamente de colocar em cima da mesa essa questão.
Está desfasada da realidade…
Sim. E vai ter um problema dentro de dez anos porque essas pessoas vão estar ainda no activo. Não se vão reformar aos 66 anos, mas aos 70 anos. Por exemplo, está provado que a capacidade para processar dados de forma automática e rotineira ou nas tarefas em áreas de contabilidade é maior nas pessoas que estão mais próximas dos 50 ou 55 anos do que nas mais jovens.
Está a falar sobretudo de gestão e retenção. E a atracção de talento sénior?
[Pausa] Mais do que ter uma política de atracção deste talento sénior, as empresas precisam de criar formas alternativas de organização do seu modelo de trabalho. Isto é, há um conjunto significativo de talentos mais seniores, a partir dos 55 ou 60 anos, que estão no desemprego por causa da crise e das reestruturações feitas pelas empresas e que dificilmente voltarão a entrar no mercado de trabalho.Essas pessoas têm um conhecimento que pode ser usado pelas empresas de forma “ad hoc” ou de prestação de serviços. Se uma empresa de consultoria ou engenharia precisar de uma equipa para um projecto de uma barragem, em vez de usar recursos da própria empresa, ficará mais barato e com a mesma qualidade recorrer a uma bolsa de engenheiros, gestores de projectos ou desenhadores [mais velhos] que estão no mercado como profissionais liberais.
Não é uma solução muito usada.
Não é, mas é uma boa solução. Liberta as empresas de uma série de encargos fixos e cria alternativas a essa população mais sénior de se manter no mercado de trabalho. Já não com um vínculo estável, com um contrato individual de trabalho, mas como prestador de serviço, como micro-empreendedor.
Da Bélgica ao voluntariado
Diogo Alarcão, 49 anos, é formado em Direito e pós-graduado em Administração Comunitária no Colégio da Europa, na Bélgica, onde trabalhou seis anos. Primeiro na Comissão Europeia e depois como adido comercial na embaixada de Portugal. No regresso a Lisboa, onde nasceu, foi director de investimento estrangeiro e, depois, de internacionalização no antigo ICEP e esteve à frente da Agência Portuguesa de Investimento no primeiro mandato de Miguel Cadilhe.
Adepto do ginásio, corrida e jardinagem, faz voluntariado, pertence à Associação Cristã de Empresários e Gestores e está na Mercer desde 2006.