Longe vão os tempos em que se selava um negócio com um bom aperto de mão e a palavra dada como garantia. Com os elevados índices de corrupção, aliados à falta de transparência, em crescimento contínuo, está na altura de inserir valores éticos e de anticorrupção nos currículos académicos. Preparar os estudantes para dar resposta aos desafios éticos é a proposta da iniciativa PRME e do seu toolkit a ser implementado em escolas de gestão e negócios
As preocupações relativas aos elevados níveis de corrupção e à ausência de transparência tanto no público como no privado continuam a dominar as agendas de ambos os sectores. E, de forma crescente, estas temáticas estão ser percepcionadas como contributos de peso para a crise financeira global que continuamos a viver, sendo que o seu impacto tem sido amplamente demonstrado pelas falhas éticas perpetradas por grandes colossos empresariais. Ao nível académico e na prática, estamos a assistir à emergência de duas grandes tendências globais no que à anticorrupção e à transparência dizem respeito. Em primeiro lugar, a gestão está a ganhar reconhecimento como uma profissão que, na generalidade, aceita normas de admissão e de conduta apropriada. Ou seja, e como afirmou Ronald Berenbeim, no seminário realizado na AESE sobre Ética nos Negócios e entrevistado para esta edição especial do VER sobre corrupção (v. Grande Entrevista), os executivos e gestores da actualidade são vistos como profissionais que devem ser julgados e avaliados não só em termos de performance, mas também no que respeita à sua conduta. Longe vão os tempos, afirma o professor que há 45 anos lida com esta temática, em que a ética nos negócios funcionava com um mero aperto de mão e sob a égide do “my word is my bond” ou “tem a minha palavra como garantia”, recorda Berenbeim. Todavia, e com a gestão escrutinada e avaliada de acordo com normas éticas e de conduta e na medida em que este consenso se vai desenvolvendo e afirmando, a prática dos negócios tenderá, de forma crescente, a ser governada por princípios éticos específicos aos quais os profissionais terão, forçosamente, de aderir (um bom exemplo é o juramento de ética que nasceu em Harvard e sobre o qual o VER já escreveu). Em segundo lugar, e também como alertou Berenbeim, estamos a assistir a uma mudança no que respeita ao peso da prevenção, detecção e aplicação de leis dos governos para as empresas, de que são exemplo as normas promulgadas pela United States Federal Sentencing Guidelines e já aplicadas, embora com variações, em jurisdições tão diversas como a Austrália, a Itália, o Reino Unido, a Suíça, a África do Sul ou o Canadá (estas normas consistem, de um modo muito geral, na criação de incentivos para que as empresas criem ou modifiquem os seus programas de ética e de compliance). De acordo com o PRME Anti-Corruption Toolkit, a compreensão destas tendências é crucial para todos os profissionais da gestão, na medida em que estas irão influenciar sobremaneira as práticas de negócio num futuro muito próximo e irão exigir que os executivos e gestores possuam um conjunto apropriado de competências que assegurem a transparência e a responsabilização nos e dos cargos que ocupam. Assim, incluir a formação em ética nos currículos académicos das escolas de negócios e de gestão consiste num passo crucial para assegurar uma resposta eficaz por parte das empresas ao crescente papel da compliance nos seus negócios e operações. Enquanto corpo de conhecimento organizado, este reforço educacional, de origem recente, e ao qual os gestores e executivos experientes não tiveram acesso na sua formação académica, está indicado como um complemento para estudos superiores em gestão, mas também em outras áreas como a economia ou ciência politica, na medida em que pode enriquecer a pesquisa e a discussão das várias temáticas e facetas que envolvem a corrupção, bem como os esforços para a erradicar. Ou, em suma, como se pode ler no prefácio do Toolkit Anticorrupção, existe uma lacuna no ensino e na pesquisa no que respeita a este novo corpo de conhecimento e que poderá ser colmatada por conteúdos sugeridos, metodologias e enquadramentos normativos para serem administrados nas escolas de negócios, em diferentes níveis da gestão e de outras ciências sociais e económicas.
A solução proposta pela PRME De acordo com os responsáveis, a existência de um curso desta natureza é vital para a integração dos tópicos anticorrupção nos currículos académicos de gestão. Há 15 ou 20 anos, quando a ética nos negócios começou a emergir como uma disciplina credibilizada, o método utilizado (nas poucas instituições que a leccionavam) baseava-se em meras discussões sobre as dimensões éticas que surgiam noutras disciplinas. Estes métodos eram, assim, superficiais, pois não estavam ancorados numa abordagem disciplinada das questões éticas que poderiam surgir na performance das funções tradicionais de um gestor ou executivo. Assim, e como defende a PRME, a integração de tópicos anticorrupção nos currículos da educação em gestão exige uma discussão concentrada na própria disciplina e nos métodos por ela utilizados. Na arena dos negócios da actualidade, escrutinada 24 horas por dia, comportamentos não éticos podem afectar os elementos-chave do sucesso da empresa – a sua rentabilidade, produtividade e marca. Assim, um curso apropriado que reconheça, analise e solucione dilemas e questões éticas, consiste numa parte vital de qualquer currículo de gestão e, no interior desta área de estudo, a corrupção em todas as suas formas constitui uma disciplina necessariamente a ser debatida. A discussão de casos de estudo e de cenários é, em termos metodológicos, parte integrante da formação em causa. Tal como qualquer decisão difícil, estes cenários exigem aos estudantes que lidem com problemas reais, onde as ambiguidades podem ser regra ou a falta de informação crítica seja também uma constante. Os melhores cenários capacitam os estudantes a identificar factos relevantes, pressupostos razoáveis sobre a informação em falta e a articular as respostas morais com os dilemas éticos. E esta articulação consiste apenas no primeiro passo. Dada a natureza dinâmica da evolução do conhecimento nesta área, são necessários estudos curriculares que relacionem a pesquisa a situações em “contextos específicos” que são baseados nas experiências de públicos-alvo. Existe uma discussão activa no interior da comunidade académica especializada em gestão e negócios no que respeita às melhores formas para fornecer os estudantes com métodos que lhes permitam operacionalizar as escolhas éticas por eles eleitas. Tal como um professor especializado em ética observou no que respeita à relação dos estudantes com os problemas éticos: “Em vez de perguntar ‘o que fariam vocês?’, as discussões de casos éticos deverão antes questionar: ‘tendo em conta os meus valores, o que faria ou diria? A quem? Como? Em que sequência?’”. O prefácio do Toolkit AntiCorrupção chama ainda a atenção para a necessidade destes conteúdos curriculares explorarem até que ponto um temperamento ético é inato ou se, e em que medida, pode ser afectado por factores “ambientais”.
Os módulos do toolkit Os 10 módulos abrangem as seguintes temáticas:
Nota: Para aceder ao Toolkit Anticorrupção, clique aqui |
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