O histórico líder da Sogrape, filho primogénito do fundador e pai do actual CEO, morreu aos 87 anos. Um “gentleman” do vinho que criou uma multinacional com operações em Portugal, Espanha, Chile, Argentina e Nova Zelândia
POR ANTÓNIO LARGUESA/JORNAL DE NEGÓCIOS
Fernando Lobo Guedes, o patriarca da Sogrape, morreu esta quarta-feira, 20 de Junho, aos 87 anos de idade, confirmou ao Negócios fonte oficial da maior empresa de vinhos portuguesa, que tem sede em Vila Nova de Gaia.
Filho primogénito do fundador da Sogrape, Fernando van Zeller Guedes, entrou aos 22 anos no negócio da família como aprendiz de tanoeiro e foi o primeiro enólogo de origem portuguesa da empresa, após estudar Enologia na Faculdade de Ciências da Universidade de Dijon.
Condecorado por Marcelo Rebelo de Sousa com a Grã-Cruz da Ordem do Infante D. Henrique, o “senhor Fernando Guedes”, como era carinhosamente tratado, assumiu em 1957 a direcção técnica de produção, tendo desenvolvido nessa época um profundo trabalho de construção e modernização das infra-estruturas da empresa em todo o país, até ascender, 12 anos depois, à administração.
Com a morte do pai, em 1987, ocupa a presidência da Sogrape, que transformou num grupo internacional com operações em várias regiões portuguesas (Douro, Dão, Verdes, Bairrada, Alentejo e Madeira), Espanha, Chile, Argentina e Nova Zelândia. Actualmente emprega cerca de um milhar de trabalhadores, tem 1.500 hectares de vinha plantada (mais de metade localizada em Portugal) e comercializa cerca de 135 garrafas de vinho por minuto.
Fernando Guedes comandou a empresa detentora de marcas icónicas, como Mateus Rosé, Sandeman e Barca Velha, até se reformar no ano 2000. Passou então a pasta ao filho mais velho, Salvador, que acabou por abandonar a liderança de forma forçada e inesperada após ter-lhe sido diagnosticada Esclerose Lateral Amiotrófica. A 1 de Janeiro de 2015 assumiu protagonismo o irmão mais novo, o quarto presidente executivo da história da empresa e o terceiro Fernando a sentar-se na cadeira do poder.
Um “gentleman” dos vinhos
Nascido a 29 de Dezembro de 1930, na Quinta da Aveleda, uma propriedade da família, Fernando Guedes estudou no Colégio Brotero, na Foz do Douro, e no Colégio das Caldinhas, em Santo Tirso, antes de uma breve passagem pela Faculdade de Economia de Lisboa, no Quelhas.
No regresso a Portugal, depois de estudar Enologia em França, casou-se com D. Ana Mafalda Maria Antónia de Mello Falcão Trigoso da Cunha Mendonça e Menezes, de quem viria a ter três filhos: Salvador, Manuel Pedro e Fernando.
Num perfil partilhado pela empresa, o patriarca é descrito como “um verdadeiro ‘gentleman’ que irradiava um charme cativante, uma afabilidade permanente que quase o levava a pedir desculpa quando explicava que o bem-sucedido percurso da Sogrape assenta nos valores da educação de uma família antiga, que viveu sempre da agricultura e sempre cultivou o respeito pelo próximo como forma de estar, recusando-se a encarar o lucro como objectivo primeiro”.
“Costumo dizer que os accionistas a quem só o dividendo interessa não se sentirão muito bem na Sogrape. Porque a nossa aposta na criação de valor visa, acima de tudo, fazer crescer o negócio e valorizar o património humano. Sempre fomos assim: é uma questão de educação e de cultura”, dizia Fernando Guedes, citado nessa mesma nota biográfica.
Apesar de estar afastado há vários anos da gestão quotidiana da Sogrape, Fernando Guedes nunca deixou de acompanhar a actividade da empresa nortenha. Aos 87 anos mantinha a rotina de comparecer todas as manhãs no seu escritório e não abdicava de fazer regulares visitas às quintas e adegas da empresa, quer em Portugal quer no estrangeiro, parte do império empresarial para o qual deu o contributo maior.
Jornal de Negócios, 20 de Junho de 2018. Republicado com permissão